“Esse é um projeto que vai muito além da sala de aula. É saúde, é ciência, é protagonismo estudantil. Aqui, eles não apenas aprendem — eles fazem, constroem, pesquisam. Eles são os autores do próprio saber”. A declaração da professora Ana Brígida Santos, coordenadora da iniciativa que vem transformando a rotina da Escola Municipal Alzira Pernambuco, no bairro do Marco, resume a essência do projeto.
Formada em Biologia e com mais de 30 anos de experiência docente, Ana lidera um trabalho que une ciência, cidadania e sustentabilidade, despertando nos estudantes o interesse pela pesquisa desde cedo. Nos corredores da escola, alunos do ensino fundamental deixaram os cadernos de lado por um momento para, com garrafas pet, filó e arroz, construírem armadilhas ecológicas contra o Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue, zika e chikungunya.
É o início de uma jornada científica real, onde eles aprendem fazendo e entendem, na prática, como educação ambiental e saúde pública caminham juntas.
“A fêmea deposita os ovos no fundo da garrafa. Em cerca de dez dias, viram larvas, depois pupas e, por fim, mosquitos adultos. A gente anota tudo: o local da armadilha, a data e o que encontramos — ovos, larvas, pupas ou o mosquito mesmo”, explica Ayme da Silva, uma das alunas participantes.
Os dados coletados são organizados e enviados para análise em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), onde pesquisadores utilizam inteligência computacional para identificar espécies e o sexo dos insetos com base no som das asas. Além da captura dos mosquitos, os alunos aprendem a aplicar o método científico: observam, fazem hipóteses, experimentam, analisam e registram. No fim, recebem o título de pesquisadores mirins, uma conquista simbólica, mas de grande valor formativo.
Para o estudante Alberto Miguel Evaristo, participar do projeto mudou sua forma de enxergar o ambiente e reforça o impacto que isso teve em sua rotina. “Montamos a armadilha atrás da escola, perto da quadra, onde tem mais mato. Descobrimos que até um copinho jogado pode virar criadouro. Agora a gente já sabe onde olhar e como agir. E leva isso pra casa também”, conta empolgado.
Esse efeito multiplicador também inclui a conscientização ambiental e é um dos maiores ganhos do projeto: os alunos se tornam agentes de mudança nas próprias comunidades, compartilhando conhecimento, eliminando focos do mosquito e incentivando a prevenção. A escola se torna, assim, um centro de ciência cidadã, promovendo conhecimento prático e relevante.
Tecnologia acessível, ciência transformadora
A armadilha é feita com materiais recicláveis e também pode ser equipada com sensores capazes de captar o som das asas dos mosquitos. Essa tecnologia, desenvolvida por pesquisadores da USP, amplia ainda mais o alcance do projeto, permitindo mapear focos de infestação em tempo real.
E o trabalho não para por aí: a próxima etapa prevê a produção de repelentes naturais a partir das descobertas dos alunos, promovendo soluções acessíveis e sustentáveis para a própria comunidade.
Para a professora Ana Brígida, o diferencial está em ensinar ciência pela vivência. “O aluno aprende o método científico com base em algo real. Ele observa, experimenta, compreende o impacto do que está estudando. Isso forma não apenas estudantes melhores, mas cidadãos mais conscientes”, reforça a professora.
Mais do que uma aula de Biologia, a iniciativa promove educação ativa e ciência cidadã. Ao incluir temas como reaproveitamento de óleo de cozinha, incentivo à presença feminina na ciência e responsabilidade social, a escola se transforma em um verdadeiro laboratório de inovação e transformação social.
Com uma abordagem que valoriza a vivência, o engajamento e a curiosidade, a Escola Alzira Pernambuco mostra que é possível formar pequenos cientistas capazes de fazer grandes mudanças. E, principalmente, reforça que a educação pública pode — e deve — ser um espaço de protagonismo, propósito e impacto real na vida das pessoas.